Análise molecular ajuda na reorganização da classificação taxonômica de alguns gêneros de orquídeas  

Posted by Mariana G. De Nadai in

Com participação decisiva de brasileiros, grupo internacional aplica técnicas de análise molecular para reorganizar classificação taxonômica de um dos principais gêneros de orquídeas. Um dos novos gêneros, o "Brasiliorchis", é característico da Mata Atlântica.

Agência FAPESP – A classificação dos seres vivos tem passado por uma revolução com o impacto da biologia molecular e da cladística – método utilizado para investigar as relações de parentesco entre organismos. Valendo-se dessas técnicas, um projeto internacional, com participação decisiva de cientistas brasileiros, reorganizou a nomenclatura do Maxillaria, um dos principais gêneros de orquídeas.

O projeto multidisciplinar, iniciado em 2001 por iniciativa de pesquisadores da Universidade da Flórida em Gainsville, nos Estados Unidos, contou com a combinação de diferentes bases de dados para traçar a filogenia molecular de Maxillaria. Os resultados foram compilados em artigo publicado em novembro no American Journal of Botany.

De acordo com um dos autores do artigo, Rodrigo Singer, professor do Departamento de Botânica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), um dos avanços do projeto foi a descrição de um novo gênero de orquídeas características do bioma Mata Atlântica: Brasiliorchis. A descoberta, de autoria de Singer, Samantha Koehler, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo, e Germán Carnevali, do Centro de Investigação Científica de Yucatan, no México, foi publicada em abril na revista Novon.

“Essas orquídeas estavam incluídas no gênero Maxillaria, mas já notamos que eram diferentes morfologicamente quando fizemos a descrição, mesmo com as análises moleculares ainda em andamento. Os estudos comprovaram que, de fato, eram um gênero à parte”, disse Singer à Agência FAPESP.

O gênero Maxillaria, segundo Singer, tem 552 espécies descritas. A revisão taxonômica, portanto, só seria possível com uma metodologia cladística e dados moleculares. No conjunto do projeto, os brasileiros contribuíram com os estudos sobre as orquídeas da flora local.

“Fizemos uma megamatriz incluindo todos os táxons, brasileiros ou não. Isso comprovou que o gênero Maxillaria era artificial – isto é, não incluía apenas descendentes de um único ancestral, ou não era monofilético, como exige a sistemática moderna. Dentro deles descobrimos outros gêneros monofiléticos como o Brasiliorchis, que ganhou este nome por ocorrer praticamente apenas no Brasil”, explicou.

O gênero Brasiliorchis conta com 13 espécies, sobretudo na Mata Atlântica. Um outro pequeno gênero, o Mapinguari, tem distribuição quase que exclusivamente amazônica. O resultado da revisão taxonômica, segundo Singer, é que o gênero Maxillaria continua extenso, mas ficou mais consistente. “O gênero ficou bem menos heterogêneo, mais coeso e mais fácil de analisar. E é sustentado por uma metodologia rigorosa”, afirmou.

A descoberta sobre o gênero Mapinguari foi descrita em artigo na revista Lankesteriana, do Jardim Botânico Lankester, da Costa Rica. De acordo com Singer, o nome homenageia uma criatura mitológica da Amazônia.

Além da Brasiliorchis, o desmembramento do gênero Maxillaria originou ainda gêneros como Camaridium, Christensonella, Heterotaxis, Ornithidium e Sauvetrea. “Essa revisão minimiza futuras mudanças de nomenclatura, estimula estudos monográficos e facilita análises evolucionárias mais precisas das espécies do Maxillaria”, destacaram os autores no artigo na Novon.


Produtividade brasileira

Singer, cuja contribuição para o projeto foi feita a partir de pesquisa de pós-doutorado, com bolsa da FAPESP, destaca o aspecto multidisciplinar dos estudos. “O projeto não se restringia à análise molecular. Muitos outros estudos trataram de caracterização morfológica dos clados [grupo de espécies com um ancestral comum ], estratégias de polinização e história natural, por exemplo. A equipe brasileira foi a que mais produziu artigos”, afirmou.

Segundo ele, a equipe de Anita Marsaioli, professora do Departamento de Química da Universidade Estadual de Campinas, encarregou-se das análises químicas de substâncias secretadas pelas flores, que são parte fundamental no estudo da polinização por pseudocópula nos gêneros Mormolyca e Trigonidium.

“A pseudocópula é uma das estratégias de atração de polinizadores mais interessantes: as fragrâncias florais mimetizam os feromônios sexuais de fêmeas de insetos. Descobrimos que o fenômeno ocorre nesses dois gêneros de orquídeas neotropicais, o que era inédito”, disse. Os estudos foram publicados no Journal of Chemical Ecology.

A estratégia de polinização, de acordo com Singer, foi fruto de uma evolução independente em cada uma das duas espécies. Isso demonstra a importância desse tipo de pesquisas para estudos da evolução. “Sem uma filogenia sólida tudo é pura especulação. Esse tipo de estudo é o ponto inicial para qualquer estudo evolucionário fundamentado.”

Com uma filogenia sólida à disposição, o grupo deverá agora fechar o foco das pesquisas, avaliando as espécies em uma escala mais pontual. “De meu lado, pretendo continuar trabalhando com Brasiliorchis e definir melhor os limites das espécies. É importante saber quais as relações entre essas 13 espécies. Alguns caracteres variam substancialmente dentro do gênero e por isso vamos precisar de uma análise mais refinada”, disse.

As orquídeas correspondem a uma das maiores famílias de angiospermas, com mais de 24 mil espécies aceitas. “Isso equivale a cerca de 10% das angiospermas, que são avaliadas em 250 mil. Além de numerosas, as orquídeas apresentam uma série de adaptações para polinização e colonização que são objeto de estudo importante”, disse.

Singer lembra que o livro sobre orquídeas On the various contrivances by which British and foreign orchids are fertilised by insects, publicado por Charles Darwin em 1862, foi concebido como um apanhado de exemplos para ilustrar a própria origem das espécies, tema do célebre livro homônimo lançado três anos antes.

Texto de Fábio de Castro
Notícia retirada do boletim Fapesp, divulgado pela Agência Fapesp

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